Ajudando a chorar
Por Pedro Camilo* [email protected]
Foi o amigo Lindomar Coutinho quem me contou a seguinte história:
Elisângela saiu de casa, no horário habitual, para buscar sua filha Raquel na escola. Era uma linda garota de seis anos, doce e amorosa, que se convertera na luz daquele lar.
Parando o carro em frente ao prédio, como sempre fazia, a mãe buzinou cinco vezes, como era de costume. Aquilo era um código entre ambas, e a filha, tão logo identificava os sons, saía, festiva, para encontrar os beijos maternos e retornar para o ninho doméstico.
No entanto, naquele dia, Raquel não saiu. Elisângela buzinou novamente, mas a menina não saía. Avistando uma funcionária na porta da escola, pediu-lhe o favor de procurar a filha, no que foi prontamente atendida.
Passados alguns minutos, a pequenina era trazida, guiada pela mão esquerda, enquanto a direita era utilizada para enxugar grossas lágrimas que teimavam em cair de seus olhos.
Chegando ao carro, abraçou-se à mãe e continuou o seu choro. Elisângela, acolhendo a filha e com carinho, perguntou se ela tinha caído, se machucado; queria, enfim, saber o que estava acontecendo.
Raquel, com os olhos ainda marejados, respondeu:
– Sabe, mamãe, a Joaninha? Pois é! A boneca dela quebrou. Era a boneca mais querida dela, mamãe!
– Ah, filhinha, foi mesmo?
– Foi, mamãe, foi. Aí, eu demorei tanto assim porque estava lá, ajudando ela.
Ouvindo aquelas palavras, Elisângela perguntou:
– Quer dizer que você estava ajudando sua amiguinha a concertar a boneca?
Registrando a pergunta e pensando por um momento, a menina respondeu:
– Não, maezinha. A boneca quebrou de vez, não tem jeito.
E, num jeito de olhar bem característico, fitou a mãe e completou:
– Eu estava ajudando ela a chorar…
* * *
Não foi à toa que Jesus afirmou que precisamos ser como as crianças, se quisermos alcançar a plenitude.
A pureza dos sentimentos e das iniciativas desses “pedacinhos de gente” nos revelam lições que os livros e os discursos mais eloquentes nem sempre conseguem consolidar em nossos corações.
Ao ver um irmão em dor, em sofrimento, costumamos exortá-lo a resistir, a que tenha resignação, a compreender que tudo aquilo possui uma causa e que não há injustiça nas Leis Divinas.
Contudo, em algumas circunstâncias, essas pessoas que nos procuram não necessitam de sermões longos e exaustivos. Carecem, apenas, de que tenhamos suficiente sensibilidade para, sintonizados com suas dores, podermos, simplesmente, “ajudar a chorar”.
*Pedro Camilo é advogado, professor Auxiliar Efetivo de Direito Penal da UNEB, professor de Direito Penal da FASETE e mestrando pela Universidade Federal da Bahia.