Funcionária da Câmara Municipal de Paulo Afonso, há 37 anos, bacharelada em direito e pedagoga, a diretora da UNISA (Polo Paulo Afonso) Maria Gorete Moreira foi candidata duas vezes a uma vaga na Câmara Municipal. Hoje, no entanto, apesar do assédio dos partidos, descarta a possibilidade de nova empreitada e não esconde o descontentamento com os rumos que a política tomou em relação às mulheres, no Brasil e, particularmente em Paulo Afonso.
(Gorete Moreira)
A Câmara, diga-se, tem uma vereadora, Leda Chaves (PDT) que nunca ousou dizer uma palavra além do protocolo para falar especificamente em temas caros às mulheres. Na prática, a classe feminina continua sem o discurso, tem-se a representação, mas não tem a fala. Ninguém, a bem da verdade, diz nada sobre a real situação das mulheres em Paulo Afonso. Não se sabe quantas somos? Qual a situação da renda? Quantas são chefes de família? Quantas estão à procura de emprego? … Obviamente que são questões que também podem e devem ser respondidas pelos homens.
(Gorete Moreira [ao fundo] compartilhando sua experiência em sessão da Câmara)
A conversa com Gorete Moreira foi exatamente para saber por que ela já desistiu. Acompanhe:
Ivone Lima – Por que não se candidatar mais uma vez?
Gorete Moreira – Não, Não. Foram duas vezes que eu tentei de diferentes formas e vínculos, e na verdade eu pensei que o povo iria aceitar ou enxergar essas tentativas com a mesma visão que todos cobram, que a mulher participe da vida política não por ser mulher, mas pela história de vida, pelos caminhos trilhados e pelo conhecimento. Eu queria que o povo tivesse me dado essa credibilidade e caso eu não correspondesse me tirasse. Mas não se trata apenas de mim em Paulo Afonso, é uma questão cultural, o machismo ainda é preponderante. Somos chamadas para os partidos apenas para compor a cota obrigatória. Vejo nessa prática até certo desdém e confesso que me choco com isso. Certamente que subestimei a população de Paulo Afonso, cujo nível cultural é forte, me refiro especialmente ao terceiro setor, por exemplo, os universitários, e te pergunto: quem representa esta classe?
Ivone Lima – As mulheres candidatas ainda contam com a rejeição da classe, como foi com a senhora?
Gorete Moreira – Pense! Às vezes as pessoas olhavam horrorizadas para mim e perguntavam para quê eu queria isso? Diziam que eu já tinha muita coisa para cuidar e mais essa? Aí eu pergunto: os homens também não têm seus afazeres? A questão não é de homem ou mulher, mas dessa desculpa.
Ivone Lima – A senhora ao menos apoiaria alguém?, alguma mulher que queira vencer essa barreira? Ainda que seja moralmente?
Gorete Moreira – Sim, vejo, por exemplo, a Leda (vereadora do PDT), o fato de ser nossa representante me cativa, eu já conhecia a pessoa, a empresária e hoje a legisladora. Caso ela me procure…
Ivone Lima – Me refiro a alguém que ainda não tenha chegado lá?
Gorete Moreira – Sim, claro, mas eu cito a Leda porque ela tem muita serenidade e está claramente se acostumando com o processo, que é delicado. Nós precisamos ter muito cuidado, porque a forma como os partidos nos chamam não nos deixam confortáveis.
Ivone Lima – A senhora é uma das maiores críticas às “mesmas pessoas”, ao fato da sociedade não conseguir dar notoriedade às mulheres que vivem, por exemplo, nas periferias, mulheres sabidamente politizadas. Por que isso acontece?
Gorete Moreira – Essa mulher, e vou aqui ser bem honesta, tem muitas coisas na vida dela, amarras que são difíceis romper. Nós tivemos recentemente o caso da Alfina (Candidata do PcdoB à Assembléia Legislativa da Bahia) veja a forma como se deu? Veja a responsabilidade no trato com a candidata? É um absurdo!
Ivone Lima – Alfina teve um dos melhores desempenhos entre os candidatos, se for considerada a forma desigual com a qual concorreu.
Gorete Moreira – Realmente. Mas vamos ser sinceros, ninguém está preocupado em dar essa abertura a pessoas politizadas, especialmente às mulheres que queiram entrar nessa evolução. Não tem, e diga-se: a própria mulher, ela fala, mas não quer. O barrismo é enorme.
Ivone Lima – Mulher e política ainda é combinação complicada?
Gorete Moreira – É complicado, mas a mulher não precisa deixar sua vida quer seja família ou outro compromisso para entrar na política, isso se faz na vida cotidiana como qualquer outra coisa que ela se dedique.